Falar em mil e uma noites é falar em infinitas noites... É a estória de luta entre o vento impetuoso e o sopro suave. Declaração de amor que anuncia uma despedida... Realizados os atos de amor físico que acontecem nas noites de núpcias, quando o fogo do amor carnal já se esgota no corpo de esposo, quando só restava esperar o raiar do dia para eu a jovem fosse sacrificada, ela começa a falar. Conta estórias. Suas palavras penetram os ouvidos vaginais do sultão. Suavemente como música. O ouvido feminino, vazio que espera e acolhe, que se permite ser penetrado... Foi assim que o deus humano foi concebido: Pelo sopro poético de Verbo Divino penetrando os ouvidos encantados e acolhedores da Virgem. A chama se apaga tão logo o corpo se tenha esvaziado do seu fogo. Seu triste destino é ser decapitado pela madrugada: não é eterno, posto que é chama. Xerazade acorda o mudo mágico de fantasias. Erotiza os vazios adormecidos do sultão. Não há orgasmo que ponha fim ao desejo. E ela parece bela, porque é pessoa bela, e não pela beleza... Mas pela beleza nossa que se reflete nela... O amor viver neste sutil fio de conservação, balançando-se entre a boca e o ouvido. É preciso saber ouvir, acolher, deixar que o outro entre dentro da gente. Ouvir em silêncio. Sem expulsá-lo por meio de argumentos e contra-razões. Somente sabem falar os que sabem fazer silêncio e ouvir. Nada mais fatal contra o amor que a resposta rápida... E, sobretudo, os que se dedicam a difícil arte de adivinhar: adivinhar os mundos adormecidos que habitam os vazios do outro.
Texto adaptado de Rubem Alvez
Sunday, August 21, 2005
AS Mil e Uma Noites
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